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há 4 anos

Novo marco legal do saneamento: principais mudanças e expectativas

Por Caroline Bailão[1]

Em 15 de julho de 2020 foi sancionada a Lei 14.026/2020, intitulada de Novo Marco Legal do Saneamento Básico, o qual prevê uma série de alterações na legislação atual com o objetivo de modernizar e universalizar os serviços de saneamento. Este marco regulatório, em resumo, visa dar mais segurança jurídica e competitividade nos processos de concessão, de modo a aumentar e atrair investimentos privados ao setor.

De acordo com a Lei nº 11.445/2007, que estabelece as diretrizes nacionais para o saneamento básico, este refere-se ao conjunto de serviços, infraestruturas e instalações operacionais de abastecimento de água potável, esgotamento sanitário, limpeza urbana, manejo de resíduos sólidos, drenagem e manejo das águas pluviais urbanas.[2]

O saneamento básico é um direito assegurado pela Constituição Federal e compreende um fator de extrema importância para aumento da qualidade de vida das pessoas, na prevenção de doenças, na promoção de saúde básica e preservação do meio ambiente.

Para efetivação da prestação desse serviço público essencial, a Carta Magna distribuiu entre as esferas de governo competências específicas e dependentes entre si, com vistas a suprir o interesse público de forma mais eficiente.

Desta feita, à União foi reservada a competência de estabelecer as regras gerais desse setor. Aos Estados e ao Distrito Federal foi conferida a titularidade das águas superficiais ou subterrâneas, fluentes, emergentes e em depósito, de modo que a outorga do uso lhes foi atribuída por derivação legal.

Por fim, os municípios e, novamente o Distrito Federal, são os responsáveis por organizar e prestar os serviços públicos de interesse local, estando a execução do serviço de saneamento básico inserida neste âmbito de competência.

Ocorre que apesar da boa intenção do legislador, na prática o setor de saneamento básico sofre com as mazelas que assolam a máquina pública brasileira de forma sistêmica.

Para se ter uma ideia, no ano de 2019 somente 53,2% das pessoas teve acesso à coleta e tratamento de esgoto, apenas 46,3% do esgoto do Brasil foi tratado, somente 83,6% dos residentes no país teve acesso a água tratada e 92,1% das pessoas teve acesso à coleta de lixo.[3]

A falta de investimentos do setor público contribui para a baixa qualidade dos serviços atualmente prestados.  Para piorar, a má gestão e ineficiência dos serviços oneram o preço final dos serviços. Estudos apontam que cerca de 40% da água tratada é desperdiçada, o que equivale prejuízo de 12 bilhões por ano.[4]

Trata-se de uma situação calamitosa e vergonhosa para um país de dimensões continentais, cuja economia é considerada uma das maiores do mundo.

Diante deste cenário, o Novo Marco Legal do Saneamento Básico reformulou a antiga sistemática do saneamento básico no Brasil, trazendo determinações inovadoras e desafiadoras ao poder público e investidores privados.

A meta, de acordo com a nova lei, é universalizar o acesso à água potável a 99% da população brasileira e a 90% o acesso ao tratamento de coleta e esgoto, até 2033. Para isso, o setor terá que atrair entre R$ 500 e R$ 700 bilhões de reais em investimentos.[5]

Dentre as principais alterações no setor de saneamento básico decorrentes do Novo Marco Legal tem-se:

1. Vedação de contratos de programa: até então era possível  a contratação de empresas estatais pelos municípios, sem licitação. A partir de agora, será obrigatório a abertura de processos licitatórios para contratação de serviços de saneamento, onde poderão participar empresas públicas e privadas;

2. Contratações em bloco: Grupos de cidade poderão se unir para contratar os serviços em conjunto. O Estado será o responsável pela formação dos grupos de municípios, que também poderão se juntar a outros de forma voluntária. Dessa forma, municípios menos atrativos do ponto de vista financeiro, também receberão investimentos.

3. Criação da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA): terá competência para editar normas de referência e diretrizes para a regulação dos serviços de saneamento básico, cuja abrangência será nacional e de observância de obrigatória, sob pena de corte dos repasses dos recursos federais. Estas normas e diretrizes vão orientar a atuação das empresas prestadoras de serviços e das agências reguladoras locais. A ANA também será responsável, por elaborar os parâmetros para fiscalização do cumprimento das metas de cobertura, os padrões de qualidade e eficiência, os critérios limitadores de custos a serem pagos pelo usuário final, entre outros;

4. Cobrança de tarifas: os municípios e o Distrito Federal passarão a cobrar tarifas sobre os serviços públicos de poda de árvores, varrição de ruas e limpeza das bocas de lobo;

5.  Extinção de lixões: os lixões a céu aberto deverão ser extintos nas Capitais até 2021 e nos pequenos municípios até 2024.

Com a nova regulação do setor de saneamento básico, espera-se que haja a reversão do desperdício de água através da aplicação dos recursos necessários e das novas tecnologias, a melhoria da qualidade de vida da população e, consequentemente a redução dos custos com saúde pública, a estimulação de valorização imobiliária e renda com turismo, entre outros benefícios.

A expectativa é que o setor privado sinta-se estimulado a investir com o aumento da segurança jurídica advinda do novo marco regulatório, bem como pelas oportunidades econômicas do setor do saneamento básico, entre elas: 1) alta demanda reprimida; 2) inelasticidade do serviço, pouco atingido por crises econômicas 3) o aumento de linhas de crédito para projetos de saneamento pelos bancos governamentais.

Por fim, tem-se que ainda precisam ser regulamentadas, via Decretos, a criação dos blocos regionais, a assistência dos bancos públicos, a participação das empresas nos procedimentos licitatórios e os parâmetros para prestação dos serviços.

Ressalta-se ainda, para que o novo marco regulatório seja eficaz e se atinja as metas estabelecidas é imprescindível que tanto empresas públicas quanto empresas privadas tenham isonomia de participação e obedeçam, sem quaisquer prerrogativas abusivas, todas as regras aplicáveis ao setor. Nesse contexto, a sociedade como um todo terá o dever de fiscalizar a prestação do serviço público sob os novos regramentos, para que de fato haja melhora e universalização dos serviços de saneamento e não regresso ao status ante tão deficitário.

[1] Caroline Bailão é Advogada e Pós-Graduanda em Direito Público.

[2] Artigo 3º da Lei 11.445, de 5 de janeiro de 2007.

[3] Disponível em: https://www.nexojornal.com.br/expresso/2020/06/25/O-novo-marco-legal-do-saneamento-b%C3%A1sico-sob-an%C3%A1lise. Acesso em 03.09.2020.

[4] Op. Cit.

[5] Op. Cit.

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